quarta-feira, 24 de janeiro de 2018

Matiz



Eis aqui uma caixa de lápis de cor.
Tão linda, uma embalagem cheia de cores.
O material é ótimo! Resistente, aparentemente duradouro.
Não há preço para comprá-la; eu a achei, pela rua.
Não posso abri-la de uma só vez.
Sem afobação, rapaz.
Nenhuma caixa se abre dessa maneira; não se iluda.
O vento desfaz as dobras.
O tempo cuida.
Aos poucos, seu interior se revela.
E, assim, suas infindas cores.
Não me pergunte quantos há.
Ou quantas cores possui.
Elas se misturam, criam-se novas.
São tantas, imensuráveis combinações.
Algumas menos comuns, mas, originais.
Uns usados, menores.
Há muito apontados; gastos.
Pintaram tantos, coloriram muitos.
Mau uso? Bom uso? Como saber?
Os intactos são poucos. Compreensível.
Tão belos, tão vibrantes.
Todos querem mergulhar eu suas cores.
Em papéis, em telas.
Na vida, por vezes tão cinza.
Cinza de dia; cinza de noites.
Cinza de muitos.
Muitos são cores.
Muitos são coloridos.
Muitos são outras cores.
Muitos são cor nenhuma.
Nem preto, nem branco.
A caixa tem todas as cores.
Até a cor sem cor.
Aquela que não tem nome.
Apenas existe, sendo única.
Aberta a futuros nomes, a serem criados.
Não há definição sempre.
O padrão é não ter padrão.

quinta-feira, 11 de janeiro de 2018

Insone.

Por que não notar o som da madrugada?
Abra a janela, olhe para rua e perceba que o silêncio é perfeitamente audível.

Casas, edifícios, blocos retangulares com suas janelas fechadas, e som de motor dos aparelhos de ar condicionado ligados. Cidade abafada, quente de calor humano. Pessoas dormem, ansiosas pelo emprego que não têm ou lamentam acordar cedo para irem trabalhar.

Normal. Quem nunca fez isso? Sem julgamentos.

Nessas mesmas casas, edifícios, pelas janelas luzes acesas, ou somente os flashes de televisões ligadas. Talvez, apenas ligadas, sem espectadores. Muitos gostam de dormir ao som de programas, filmes ou simplesmente apreciam aquela luz tremida que o televisor emite no quarto. Medo do escuro, eis mais uma possibilidade. Tememos o que não podemos ver. Tememos o outro; o futuro.

O céu é cinza. Dá para perceber quando está nublado, mesmo durante a noite. O vento morno dessa noite prenuncia chuva. O som das folhas das árvores batendo umas nas outras que chamou a minha atenção. Particularmente, amo essa música que produzem. Gosto de assistir aos passos que dançam obedecendo a cadência dos ventos, da natureza que não cessa em encantar, até quando muitos não a apreciam. Se chover, ficarei ainda mais encantado. Como é bom deitar para dormir ao som da água caindo sobre o asfalto, vislumbrando as colisões que imagino ao escutar trovões. Os raios que clareiam o cômodo temperam meu espaço sombrio pelo horário. Satisfaço-me.

Carros não passam, por vezes, passam. Um a cada minuto, creio eu. Não cronometrei. Pensamos no que motiva alguém a pegar um carro às duas da manhã. Volta do trabalho, esticadinha com os amigos, fuga da polícia, doença, tragédia? São poucos que passam. Não importa.

Menos ainda são pessoas. Não há, simplesmente não há quem caminhe por aqui tão tarde, ou tão cedo. As ruas parecem outras sem as cores que o povo dá a elas. O rebolar da vida acontecendo é o oxigênio das cidades. É como caminhar pelo centro da cidade em um Domingo chuvoso no cair da tarde. A vida é composta pelo movimento das pessoas. No Domingo, lá, não há vida. Na madrugada, aqui também não.

Melhor deitar-me. Apagar as luzes e fechar os olhos.

Cansei.

Os pensamentos que chegam a nossas mentes somente na hora de dormir nos invadem como ondas gigantes de um filme americano que retrata desastres naturais. Por vezes, sou arrastado por essas águas violentas e me pego assim, às quatro e trinta e sete da manhã, acordado e imaginando o que vai acontecer. Quando vai acontecer e se irá acontecer.